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Gavetas

Quando tinha por volta dos meus doze anos, me lembro de estar atrasado para a escola. Minha mãe gritava lá de baixo para que eu logo fosse tomar café. Mas eu não achava minha blusa do uniforme.


Ensino rígido do interior, sem ela não entraria.


Depois de muito ouvir xingos por minha desorganização, fui atrasado e sem comer.


Desde aquele dia aprendi a organizar melhor minhas coisas, não queria viver aquilo novamente. Sentei na carteira com fome e sem dinheiro para o lanche no intervalo.


Mas acho que exagerei, fiquei tão organizado que tive problemas na vida adulta.


No trabalho não gostava que tirassem meus papéis de lugar, em casa fotografava minha estante para garantir que todos os livros voltassem a ordem pré-estabelecida e assim fui me tornando um noiado pela ordem.


Ele sempre reclamou disso, que nossa casa não podia ter um fio fora do lugar. As brigas se acumularam, acentuaram.


Não muito depois, descobri que ele estava de conversinhas com outro, o novato do trabalho. Talvez um desorganizado que deixava tudo largado, toalha em cima da cama.


Será que isso lhe dava tesão?


Magoado, decidi terminar, considerei o flerte uma traição.

Uma semana depois ele me ligou querendo conversar, acabamos voltando, apesar da mágoa o sentimento era maior. Foda foi ele me perguntar se eu tinha ficado com alguém nessa semana.


Engoli em seco meu café e menti. Organizado que sou, brinco que tenho meus flertes e casinhos em gavetas. Namorando deixo elas bem fechadas, mas solteiro, sabe como é. Não perco a chance.


Depois que perdi meu uniforme, aprendi a organizar melhor minhas gavetas, uma pena que ele, bagunceiro que é, nunca vai entender.

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