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TRATADO DE TORDESILHAS

Tem dias que é só me sentar na frente do computador e as ideias parecem que vão caminhar na praça, dar milho aos pombos. Vem uma necessidade súbita de tirar o pó da mesa, brincar com o gato. Se começar a rolar o feed do Insta? Aí já era meu amigo lá se vai uma hora perdida.


Nem é bloqueio criativo nem nada disso. É ela, a musa dos artistas e todos aqueles que precisam entregar um relatório até o final do dia.


A senhora procrastinação.


E quem é essa senhora de nome difícil de falar?


É aquela que aparece bem quando se tem algo importante pra fazer, mas não se tem motivação. Eu a conheci na quarta série, fazendo uma pesquisa sobre o Tratado de Tordesilhas. Enquanto a professora Cleide queria que eu entendesse o pacto entre Portugal e Espanha. Eu já aprendia desde cedo que tem coisas que a gente faz por obrigação. Ou com dizem por aí: — Na força do ódio.


Mas nem era essa a questão, eu gostava dos trabalhos de pesquisa, por mais estranho que possa ser. O chato mesmo era ter que copiar tudo a mão no caderno. Em um lápis número dois que devia vir de brinde com o apontador já que o que mais fazia era quebrar a ponta.


Nesses momentos, a vontade de fazer coisas mais divertidas tomam a mente. O videogame parecia me chamar, a fita no Mario Bros brilhava na estante.


Da janela se ouvia os meninos jogando bolinha de gude e do nada me veio uma vontade de brincar com meus bonecos dos Power Rangers. Aqueles que viravam a cabeça.


Pois foi isso que eu fiz, virei a cabeça, fingi que o chamado não era comigo. Fingi que nem conhecia essa senhora procrasti... não sei o que.


Fui escrever sobre o tratado que traçava uma ilha e definia: — Desse lado é meu e desse lado é seu. Parecia a gente jogando porta bandeira na rua. Com um tijolo traçávamos a rua e definíamos o campo nosso e o campo do adversário.


Mas isso é só lembrança, a brincadeira era outra. Era um cabo de guerra na minha mente. Entre o legal e o necessário. Entre o que eu quero e o que eu preciso.


Alguns bons anos passados, de quando as tardes eram enciclopédia Barsa aberta e copias sem fim em papel almaço, eu ainda me encontro com essa dama sorrateira.


Sempre que pego meu caderno de ideias e me organizo pra escrever o texto da semana, ela se senta ao meu lado, querendo me lembrar que tem outras coisas pra fazer.


Mal sabe ela o quanto que eu amo isso aqui.


Que libertar as ideias presas na minha cabeça é quase que uma necessidade, um vício! Que a crônica semanal é só uma rotina comercial dentro de um hobbie profissional.

Eu sei e admito que quando ela se junta com um dia daqueles e o cansaço dos afazeres, a vontade de se deitar no sofá e rir de alguma bobagem no Youtube flerta comigo.


Respiro fundo e volto aos pensamentos. As palavras que merecem morada no papel já sabem seu lugar: A crônica de sexta.


As linhas que o seu Antônio lê antes de ir abrir a padaria. O texto que daqui duas semanas o seu Carlos irá usar pra enrolar peixe fresco na feira.


De qualquer forma, essa senhora que só vem atrapalhar meus textos está sempre comigo.


Tem dias que ignoro, tem dias que chamo pra tomar um café. Mas o texto, esse eu nunca deixo de escrever.

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